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terça-feira, 2 de dezembro de 2008


FAMÍLIA NÃO É EMPRESA


Na Bienal do livro de 2008, no Rio de Janeiro, Fabrício Carpinejar se surpreendeu ao ouvir o escritor Içami Tiba professar, em palestra, a frase: “A família é como uma empresa”. Para expressar e ecoar sua indignação por tal aforismo, ele publicou em seu blog o texto Família não é uma empresa, ponto de vista que merece também nossa concordância e reflexão.

Quando um educador compara a família com empresa é sinal que o mundo dos negócios ganhou tamanha proporção que já confundimos espaços públicos e privados. Como não separar empresa de família? Pai não é patrão, mãe não é secretária e tampouco devemos confundir filhos com empregados.

O espaço familiar é onde construímos nossa subjetividade, onde não deveríamos precisar disfarçar os desejos. É espaço da intimidade por excelência, onde podemos ficar em silêncio pelo tempo que for necessário, sonhando com um futuro que talvez nunca exista. Lugar onde o benefício é de graça, pois nos é dado por quem nos ama.

Família é romance, história, memória e experiência. Lugar de ensaiar o futuro - errando, sofrendo e aprendendo. É onde podemos mostrar os tropeços e pedir encorajamento. É na família que guardamos nossa dor quando saímos para o trabalho, pois nem sempre devemos levá-la conosco. Na empresa nunca nos apresentamos por inteiros - sempre escondemos nossa miserabilidade, nossa condição de incompletos, faltosos. Por vezes, fazemos semblante de infalíveis como se tudo estivesse sob controle. Não dizem que quando se sai para trabalhar os problemas ficam em casa?

Lar é espaço para relaxar e chorar, para deixar o desejo esparramar, para nos soltar em devaneios sem vergonha de assumir nossas verdades, acariciando entranhas e fantasias. A família é o único lugar que acolhe o nosso lado obscuro, crepuscular, lugar que tampouco conhecemos.

Empresa é lucidez, razão, disciplina. Família é afeto. A primeira exige eficiência, o cumprimento de metas, a outra deve ser compreensiva com a desordem, o desequilíbrio, o fracasso, tendo em vista que o caos pode provocar a criatividade. Dois espaços totalmente distintos - um é para ganhar dinheiro, o outro é mais para aprender como gastá-lo, definindo valores e prioridades.

Mesmo os pais mais exigentes dificilmente vão colocar na rua filhos irresponsáveis, indisciplinados. Pode-se querer ir embora por razões diversas, mas a porta estará sempre aberta para acolher o riso ou o pranto. Na empresa, a ineficiência de alguém pode gerar uma demissão, na casa vai exigir compreensão, paciência e perseverança na reparação.

Essa confusão entre empresa e família tem se traduzido em prejuízo aos jovens que tentam ingressar no mercado de trabalho. Acabam se comportando com intimidade com o chefe, sem saber o limite entre esse e um colega ou tratam o chefe como se fosse pai.

Confundir a casa com a empresa é um erro tanto quanto confundir a empresa com a casa. Esse tipo de confusão revela o declínio das relações afetivas, da importância da dimensão humana na vida das pessoas. A família que quer ser como uma empresa é aquela que ainda não aprendeu que o trabalho é para sustentar os sonhos, colocá-los em dia, e que gente é mais importante que coisa. Empresa fabrica coisa e família educa gente.